Copa do Mundo 2010

A África da Copa

Muito mais do que conhecer belezas naturais fantásticas, safáris e uma estrutura de turismo organizada, ir à África do Sul pode ser a chance de quebrar paradigmas, desfazer estereótipos e, quem sabe, compreender o que significa para esse país ser a sede da Copa do Mundo de 2010.Foi no último dia de viagem que encontrei um exemplo para ilustrar isso. Uma partida entre os dois principais times de Johannesburgo, a maior cidade do país. O clássico é como se fosse o nosso Gre-Nal, mas em dimensões nacionais. Em qualquer lugar, ou se é Orlando Pirates ou Kaiser Chiefes. Os dois clubes nasceram no Soweto, o bairro criado pelos brancos durante o apartheid para afastar os negros do centro. Hoje, vivem lá mais de dois milhões de habitantes. Dois milhões de negros. De lados opostos na hora de torcer, mas unidos na luta contra a discriminação.No estádio lotado, quase não havia brancos. O futebol é ainda visto como esporte de negros. Uma cultura que vem dos 40 anos do regime de segregação, no qual os cidadãos eram divididos pela cor da pele, e os negros, privados de muitos direitos. Não faltaram barreiras no sporte. Os brancos praticavam o rúgbi, o esporte mais popular entre eles. Para o futebol, havia inclusive ligas separadas, e raças diferentes não podiam se enfrentar.Aos apaixonados pelo futebol, falta confiança na seleção Bafana, Bafana. Todos têm um time da Inglaterra para torcer. A pouca tradição nacional se explica porque a África do Sul só voltou a participar de competições da Fifa com o fim do apartheid, a partir de 1992. Venceu a Copa das Nações Africanas em 96, mas em Copas do Mundo foi eliminada na primeira fase nas duas que disputou, em 1998 e 2002. Quinze anos depois da eleição do primeiro presidente negro (Nelson Mandela, em 1994), os sul-africanos não esperam apenas melhores resultados em campo. Apesar dos problemas de estrutura que preocupam para a Copa, como o transporte público precário e a falta de segurança nas ruas, se esforçam para acabar com uma imagem de desconfiança que existe até mesmo dentro do país.No clássico dos times do Soweto, a diferença ficou por conta da cor predominante dos uniformes: preto (Orlando Pirates) e amarelo (Kaiser Chiefs), porque a atmosfera era uma só. Nada de incidentes no estádio ou arredores. Vi duas torcidas rivais chegarem juntas, em paz, cantando e dançando no trajeto até os portões. Tinha até coreografia para sugerir ao técnico que estava na hora da substituição. O 2 a 1 para os Pirates, pelo menos para quem viu de fora, pareceu nem importar, tamanho o entusiasmo nas arquibancadas.Não é para menos. É o esporte da favela que, desde agora, atrai para a África um olhar diferente do resto do mundo. O continente da miséria, de doenças, de guerras, abre as portas para ser reconhecido pelo orgulho e superação. A Copa de 2010 é, sim, uma conquista dos negros. Eles sabem disso, mas, contrariando a história, querem fazer um evento de todos.CRISTINA VIEIRA Especial/África do Sulhttp://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2544636.xml&template=3898.dwt&edition=12506&section=1010

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